sexta-feira, 25 de março de 2011

Escola Municipal Professora Áurea Melo Zamor

Aracaju – SE, 18 de fevereiro de 2011.


Hoje, sexta-feira manhã de chuva, encontramos uma situação na escola que nos deixou muito tristes. Alguém destruiu os nossos dois pés de batatas doce. Eles foram plantados no ano passado (2010) pela turma F. Sara, aluna da turma trouxe duas batatas doces brotando folhinhas, ou seja, querendo virar pés de batatas. Nós escolhemos um lugar ao pé do muro, próximo ao pátio da escola e plantamos as duas batatas. Dias depois nasceram dois pés de batatas, se encheram de folhas verdes e ficaram esparramadas pela terra. Todos as manhãs fazíamos a rega e conversávamos com os pés de batatas.
Ao retornar as aulas esse ano (2011) vimos que ao fazerem a capinagem na escola, cortaram os pés de batatas. Todavia, foi observado que as raízes estavam presas a terra por um pedacinho de caule que restou. E, aí, para nossa surpresa e grande alegria, dois após, folhas verdinhas brotaram naquele pedacinho de caule. Os pés de batatas renasciam. Nossa tristeza aconteceu quando um homem veio plantar macaxeira na escola, sem a nossa presença e participação e destruiu os pés de batatas, cobrindo-os com muita terra e plantando sobre eles, pés de macaxeira.
Essa carta é o nosso PROTESTO e será entregue a Coordenação da Escola. Todos devem cuidar das experiências que fazemos na escola. Isso não deverá acontecer de novo. A escola é de todos nós!

Esse texto foi construído coletivamente pela professora e todas as crianças que formam a turma F e por suas autoras e autores seguirá assinado.

Assinaturas:

Todas as crianças assinaram o documento impresso e cada uma levou uma cópia para ser lida em casa pelos familiares.
Uma pá de cal nas histórias
* Rosiane Chagas


Pertencessem ainda ao mundo dos vivos, Monteiro Lobato, Sylvia Orthof, José Paulo Paes, Cecília Meireles, dentre outros escritores, ficariam estarrecidos com a atitude tomada pela Secretaria de Educação de Aracaju, que passo a relatar.
Como idealizador da Sala de Leitura da E.M.E. I Profa. Áurea Melo Zamor, situada no Conjunto Orlando Dantas, o saudoso professor Enaldo Santos Silva, profissional extremamente comprometido com a causa da educação pública, e com marcas positivas na passagem pelo Sistema Municipal de Educação de Aracaju, criou e me motivou a enveredar pelos caminhos da leitura com crianças na educação infantil, nos anos de 1995-1996. Criamos projetos que foram acontecendo no decorrer dos anos e com todas as dificuldades impostas pelas precárias condições de trabalho sobreviveram na sua concepção e resistem a atual conjuntura de abandono na qual está mergulhada a educação pública de Aracaju, em especial a educação infantil. A essência pedagógica se traduz na prática sistemática da leitura que garante o acesso de todas as crianças aos clássicos da literatura infantil e a toda literatura de boa qualidade, um caminho para a instituição escolar contribuir decisivamente na formação de uma geração de leitores, de seres humanos críticos, participativos, responsáveis e cada vez mais humanizados. Ressalta-se que as crianças são todas oriundas de famílias de baixa renda e conseqüentemente baixo índice de escolaridade. Isto significa que é na escola que elas têm acesso a livros e a literatura. Muitas vezes é somente na escola que cada uma vive essa experiência de formação. A sustentação teórica do trabalho vem de atividades referentes à temática: Congresso de Leitura do Brasil – COLE; LEIA Brasil – programa de leitura subsidiado pela PETROBRAS – integrando os encontros desde do ano 1997, além de ser ex-integrante o PROLER-SE, programa de leitura do Ministério da Cultura.
Após anos de realização dessa atividade, cujo resultado se observa no comportamento das crianças, que passam a expressar interesse real por livros e leitura, e mudança de postura de mães que buscam na escola o empréstimo de livros para ler em casa para os filhos, recebe-se hoje, por parte da SEMED, não apoio ao trabalho que vem sendo feito, mas uma pá de cal nas histórias. O acanhado espaço físico, que foi se construindo na concepção e na prática, se arrumando para ficar lúdico para as crianças e se constituindo, dentro da escola, como Sala de Leitura, será extinto, segundo falas de “burocratas” da Secretaria. Chegaram à escola, olharam e falaram: “derrubamos essa parede, e aí teremos outra sala”. Ao se perguntar sobre o trabalho que acontece naquele espaço, teve-se como resposta: “passa a ser itinerante”. Não se quis saber da especificidade metodológica, o que pensam as crianças - público mais interessado na Sala de Leitura - nem o que pensam docentes que trabalham na escola sobre o assunto em questão. Decidi a forma de uma atividade acontecer não cabe a técnicas da Secretaria, mas de quem faz o trabalho na escola. De onde vem tanto autoritarismo? De onde vem tanto desrespeito ao trabalho de quem está na escola? Cadê a gestão democrática? Há um Conselho Deliberativo eleito e legalmente instituído, cujo papel é discutir, deliberar e encaminhar decisões de interesse da escola, observando a legislação vigente. A gestão democrática não se faz no texto frio da lei, mas nas ações cotidianas, deve ser construída e reconstruída no chão da escola, no enfrentamento dos conflitos, das divergências, mas também no prazer das conquistas no processo ensino-aprendizagem, nas alegrias de atividades culturais ricas e participativas, como aconteceu no último dia 29/10 - Festa em homenagem ao dia nacional do Saci Pererê.
Há espaço físico na escola para a construção. Extinguir o espaço da Sala de Leitura é inaceitável. A escola e as crianças não podem prescindir desse espaço educativo. Espera-se que a SEMED faça o exercício do diálogo com a comunidade escolar na busca de outra solução para instalação de novas salas.

* É pedagoga e responsável pelo trabalho realizado na Sala de Leitura, na Escola Municipal de Educação Infantil Profa. Áurea Melo Zamor.

Aracaju-SE, primavera do ano 2010.